sexta-feira, junho 15, 2007

Miradouro da Lua

Naquele dia, em que a lua entardecia e Luanda parecia querer amanhecer, o pássaro de ferro pousou suave, habituado que devia estar, automaticamente, a tais paranças. Na volta até se dorme, mas no regresso não há sono que amortalhe tantos e tamanhos pensamentos de antanho. E assim cheguei, despido de ideias feitas e quase nu, mas com uma faca no bolso, para cortar os nós de amarração a quem de amarras diz que já não precisa. Luanda aqui e a lua finalmente desaparecida. Ou então apenas tomada de recaída no parapeito dos meus olhos.
Nessa manhã em que Luanda me amanhecia, os meus pensamentos desceram, calçados em velozes pés de gazela, até à marginal e abancaram na ilha a ver, só assim mesmo, a baia maravilha. Mais, muito mais de mil imagens atropelaram-se-me na desempoeirada memória com que o caçador de gambozinos conta cada história. A cidade da lua que entardecia, morria e renasce a cada dia, estava ali a beijar-me à flor da pele. Areia morena na hora de fazer as pazes sem cachimbo. Água quente em época de fino cacimbo. Sol a crescer a pique que demorava. Lenta a pressa que é uma pressa de quem aqui tanto se amava. Cheiros da terra, sons ao vento e balancé de ininterrupto movimento nas ancas da mulher que passa. Agora me reencontro e me entrego à terra da lua e à sua graça.